sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Lá onde minha mãe mora

Olá!!
Pra começar o blog, posto um texto já pronto. Esse foi meu primeiro "grande" texto, ou minha primeira "grande" crônica, e achei legal usar na estréia. É um texto sobre um dos locais mais estranhos que conheço...
Bom, lá vai...

LÁ ONDE MINHA MÃE MORA
Por Ana Selena

Totalmente baseado em fatos.
Não existe lugar no estado de São Paulo como o lugar onde minha mãe mora. Não é longe da capital, mas ninguém conhece. E quem conhece te olha com uma cara de “vixeee” ou de “boa sorte”, ou até de “corajoso heim?” quando você diz de onde vem ou pra onde vai.
Até existe um motivo muito razoável para ninguém conhecer: Não existe nos mapas locais. Com muito custo da pra achar no Google Earth, mas as estradas que vão até lá aparecem nos mapas apenas pela metade, e ali após o suposto fim delas, só tem uma grande área verde. As ruas não existem em nenhum registro, e o GPS sempre te aponta no meio do nada. É um tipo de área 51 paulista. Ninguém da família entende do que ela se esconde, mas enfim... Não me cabe especular essas coisas, ela é minha mãe e eu devo respeitar as esquisitices dela.
É um lugar fora do comum. Um suposto bairro, composto por algo menos que uma dúzia de ruas, todas de terra - o que gera muita poeira no calor e muita lama na chuva –  com muitas árvores, insetos, árvores, manacás da serra e alguns vira latas. A água é bombeada de algum lençol freático, sem nenhum tratamento, e que é muito boa por sinal (ainda bem, pois diminui a necessidade de uso do posto de saúde que fica bem longe). Energia elétrica tem (sei lá como), nos dias que não chovem muito, mas iluminação pública não. Telefone também tem, na maioria dos dias – o que é bem aceitável. Mas celular, só com muita sorte. E de preferência num lugar alto e aberto. Você pode pensar “ué, normal.” Mas lembre-se que não estamos mais em 1999 ou 2000. Como não podia faltar, lá tem umas 3 igrejas e uns 3 botecos, e não acredito ter população suficiente para tanto... Mas como isso tem em qualquer local inabitado do Brasil, não conta como infra-estrutura. Não tem carteiro; Afinal, as cartas não chegam a endereços que não existem. Mas tem uma caixa postal: Alguém recebe as correspondências em algum lugar coloca-as para os moradores locais num armário enferrujado, que fica disposto no mercadinho/quitanda/materiais pra construção/bar. Tem transporte público: uma linha de um veículo só, que passa a cada 2 horas, que é mais ou menos o tempo q ele leva de um pra fazer uma viagem de ida e volta. O último ônibus sai da civilização as 20h, e sai de onde minha mãe mora às 21h. Isso se o tempo estiver bom, por que se estiver chovendo ele para no meio do caminho e as pessoas tem q andar na lama até ele. E escola, bom... a mais próxima fica a uns 5 ou 6 km, e a única pessoa que eu conheci que estudou lá, largou a escola alegando que estava ficando perigoso.
Falando em perigo, a policia também não vai lá. Nunca precisamos de nada da policia, não oficialmente, mas já ouvi pessoas dizerem que se chamam a policia eles dizem que é um local de muito difícil acesso, e que farão o possível – e fim. Mas uma vez li uma matéria sobre a legalização da maconha e havia um trecho falando sobre um cara que plantava maconha para consumo próprio no terreno em que morava, afastado da cidade. Ele disse “Aqui não chega água encanada, mas a policia chegou”. Será que o segredo é esse? Por que lá onde minha mãe mora, também não chega água encanada... E nem a policia. Pensei em sugerir pra minha mãe que, se um dia ela precisasse da policia e a mesma custasse a aparecer no local, ela podia ligar e dizer “olha... eu tenho uns pezinhos de maconha plantados no meu quintal.. por que vocês não vêm dar uma olhada?”
As pessoas. Aparentemente comuns, mas, no fundo, estranhas. Algumas simpáticas, outras fechadas, e algumas só querem mesmo cuidar da sua vida e te dizer como viver – nada fora do comum. Algumas ouvem música muito alta, e outros não têm TV nem telefone. Alguns tem celulares que não funciona... Mas enfim! Todos falam mal da infra-estrutura, mas ninguém que discutir sobre isso com os órgãos competentes. Todos tem medo de alguma coisa. Acredito até que alguns nunca nem tenham saído de lá. Os casos mais diferentes são a senhora que anda sozinha no breu, indo pra igreja com uma lanterna, assustando todo mundo, e o vizinho estrangeiro com sotaque não identificável, simpático e sorridente, mas com uma família que raramente se via fora de casa - uma das quais não tem nem TV, nem telefone.
Como em todo lugar pequeno, essas pessoas dividem fofoca e inventam histórias cabeludas. A minha preferida é a do estuprador que entrava nas casas quando a mulher estava sozinha, fazia o que queria com ela e depois sumia. Alegaram tê-lo visto na rua de cima, na rua de baixo... Atenção: viam o cara. Imagino algo do tipo “Olha lá o estuprador. Vamos nos esconder ali e ver pra que lado ele vai agora, ai a gente avisa as pessoas né? Fazemos uma boa ação.” Mas eu gosto desta por que um dia disseram que mataram ele. Ai na semana seguinte o próprio pareceu dizendo que tava muito vivo, e que não estuprou ninguém, e que ele é que ia matar o cara que disse que matou ele. Eu também não tento entender essas coisas. Fato é que o matador bem feitor ficou quietinho e sumiu também.
Por ser uma região de chácaras, em alguns finais de semana se vê gente diferente. E música alta sempre – talvez as pessoas achem que por ser um lugar de refúgio, pode fazer o barulho que quiserem. Além das igrejas, tem também um terreiro, que é freqüentado por gente de muitos lugares. Mas nos domingos, impera a disputa de quem faz mais barulho – eles ou a igreja mais próxima. Então ouvimos a música formada pelos hinos cantados ao som dos batuques do candomblé. Lindo, e ao mesmo tempo sinistro.
Esse lugar mágico e místico é o lugar que minha mãe escolheu pra morar - numa linda casa amarela, perfeita se você quer se livrar da visita dos parentes. A casa está à venda agora, e os interessados, fugitivos ou aventureiros, podem me procurar e agendar uma visita, de preferência num dia sem chuva, e claro, antes de anoitecer.

Um comentário:

  1. Hahahaha, eu já fui nesse lugar!!! posso dizer q é examente essa a descrição, e talves um pouco mais, pq posso falar q depois q vc passa todo esse caminho, e finalmente chega na rua da casa dela... um 4x4 cai bem... XD

    Um bjo pra lunícola do meu coração... =*

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